Conversamos com o Carlos Tristacci, executivo do Digital Hub da Globo, para entender como a empresa está transformando seu core business, em busca de se tornar uma media tech. Essa é a estratégia da corporação para continuar crescendo. O “Programa Uma Só Globo” é a principal iniciativa da empresa rumo ao seu objetivo de se […]
Conversamos com o Carlos Tristacci, executivo do Digital Hub da Globo, para entender como a empresa está transformando seu core business, em busca de se tornar uma media tech. Essa é a estratégia da corporação para continuar crescendo.
O “Programa Uma Só Globo” é a principal iniciativa da empresa rumo ao seu objetivo de se tornar uma media tech. Essa é uma empresa de 50 anos da indústria de mídia que não vê mais seus concorrentes como as empresas tradicionais de mídia: SBT e Band.
Grandes corporações do ramo tecnológico, como Facebook, Amazon, Apple e Netflix, deixam de ser apenas plataformas tecnológicas para aderirem à produção de conteúdo. Ou seja: empresas de tecnologia entraram no mercado de mídia. “Nossos concorrentes mudaram, e nós tínhamos uma escolha a fazer.
Podíamos ser uma B2B2C: continuar como uma empresa de mídia, licenciando conteúdo para Amazon e Netflix. Qual é o problema: você lembra quem produziu a última série que você assistiu no Netflix? Não. Então assim você perde relevância. A outra opção é que poderíamos ser uma D2C (direct to consumer). Isso já é mais interessante.
Quando você vê um conteúdo no Globoplay, você sabe que aquele conteúdo é da Globo. Então ter uma plataforma de streaming (como o Netflix e Amazon Prime) é relevante para o negócio.”
Esse entendimento fez a empresa se posicionar como uma Media Tech Company, articulando a fusão das diversas empresas do grupo (Globo.com, Globosat, Som Livre, Tv Globo…) em torno de uma mesma visão. Curioso com o processo? Continue lendo. Vamos falar mais sobre isso a seguir.
Já comentamos aqui que todas as iniciativas de mudança devem partir de uma visão estratégica. Não adianta criar um esforço de transformação digital só porque os concorrentes estão fazendo isso. No caso da Globo, isso é ainda mais essencial.
O movimento da corporação é bastante complexo, porque não se trata apenas de uma transformação digital. Envolve a fusão de empresas com características heterogêneas.
Cada uma tem seus planejamentos estratégicos, públicos, metas, modos de trabalho, culturas e particularidades. Depois de definir a visão de longo prazo comum, foi preciso fazer com que cada empresa mirasse nessa mesma direção.
Carlos sabia que não seria possível criar uma homogeneidade total dentro da Globo. Cada empresa dentro do grupo funcionava de uma forma própria. Por exemplo: enquanto o Globoplay tem uma preocupação recorrente ao acompanhar suas assinaturas, o Cartola tem características sazonais. Assim que acaba o Campeonato Brasileiro, o time começa a pensar na próxima temporada. Adotou-se uma visão multi-speed. “Toda empresa está indo para uma cultura generativa: de geração de valor e performance.
O ágil é a ferramenta que estamos usando para isso. Não é o ágil pelo ágil. O ágil é processo, ferramenta. O que dá resultado serve. O que não dá, não serve. Isso depende das particularidades que já mencionei. Nesse multi-speed, por exemplo: o núcleo de soluções corporativas não tem pressão de mercado. Se um servidor parar de funcionar às 2h da manhã, tudo bem. Agora se o Globoplay sair do ar por 2h, é essencial voltar o quanto antes.” Cada time, portanto, deve adaptar o mínimo comum definido (de processos e métricas) para o seu contexto.
Para tanto, todos os times usam a metodologia de OKRs, para citar um exemplo dessas padronizações, garantindo que os objetivos de curto prazo estejam alinhados com a visão de longo prazo. Essas mudanças nem sempre são simples.
Pegue, por exemplo, o caso da Globo. Com, uma nativa digital. “Mesmo lá dentro, os times tinham muita autonomia para definir seus métodos de trabalhos. Qual o problema? Os times escolhiam suas estratégias de acordo com uma demanda de negócio. Negócio demandava, tecnologia entregava. Mesmo de uma única empresa, tinha um ambiente heterogêneo.”
Com a mudança, as áreas de negócios e tecnologia passaram a trabalhar juntas. “Numa transformação do nível que a Globo está fazendo, muitas
vezes eu perco no micro pra ganhar no macro. aquele ditado: ‘se quer ir rápido, vá sozinho. Se quer ir longe, vá acompanhado.’
Num squad ágil, o time pode caminhar sozinho e entregar super rápido. Mas produtos de sucesso demoram pra serem construídos. Ao mesmo tempo, é muito difícil fazer isso na velocidade que o mercado exige sozinho. Preciso de N times.
Preciso ir em conjunto.” O trade-off, ele sugere, é uma perda de autonomia, mas ganho de visão estratégica. Há ainda a percepção de como as entregas e atividades do dia a dia impactam nos resultados da empresa. Segundo Tristacci, “quando os times veem que podem contribuir para isso, ganham propósito no seu trabalho.”
O resultado? Diretores que antes não conseguiam conversar de estratégia com o time, agora falam disso até com o estagiário.
Mas isso, claro, não aconteceu da noite para o dia. Para iniciar os esforços de transformação, Tristacci recomenda começar com um projeto mais simples e que possa servir de exemplo para o resto da companhia. Como ele gosta de falar: é o engajamento pela inveja.
Quando você coloca o spotlight no time que está liderando as mudanças e reforça os resultados obtidos através dela, você vai criando um desejo inconsciente pela mudança. Isso porque o medo do novo é uma barreira dentro da maioria das organizações. “Se a gente fala de novos papéis, novas responsabilidades, as pessoas se preocupam. Elas se perguntam: ‘como vai ficar minha carreira?’ Cada colaborador, consciente ou inconsciente, quer uma resposta para a seguinte pergunta: ‘o que eu ganho com isso?’” Quando a missão se torna mais importante que o cargo, as lideranças podem travar a transformação por ego ou apego à hierarquia.
E o melhor jeito de quebrar essa barreira é reforçar os comportamentos desejáveis. Hacks de cultura são bastante úteis aqui. “Se a primeira iniciativa tiver insucesso, eu acabei com a mudança”, conta Tristacci. “A gente fez isso com um time pequeno, que conseguiu uma diminuição expressiva até a entrega de um projeto.
Então colocamos esse time no meio da área de desenvolvimento. Posicionamos quadros para facilitar o processo criativo, enquanto o resto do ambiente estava cheio de pessoas com fone de ouvido e que nem se falavam.
Quando elas viram aquele oásis com as pessoas conversando, trocando ideia e até se divertindo, começaram a se perguntar: ‘o que tá acontecendo ali?’ E começaram a perguntar quando iam ter aquilo também.” Esse é um hack de cultura.
A ideia dos hacks de cultura tem tudo a ver com criar desejo em torno da mudança. Foi assim que, conforme Tristacci explica, “nossos maiores detratores agora viraram os maiores defensores da mudança.” Por isso a figura do patrocinador da transformação é tão importante.
Seja essa pessoa uma visionária à la Steve Jobs ou alguém que precisa liderar a transformação por sobrevivência, ela ainda precisa trazer o lado inspirador. “Ser um comunicador é muito importante.
Assim você consegue articular as ideias e influenciar as pessoas. Não adianta ter uma grande ideia que ninguém compra. Em empresas grandes como a Globo isso é particularmente desafiador. Você só consegue realmente se aproximar do seu objetivo e subir um degrau nessa direção quando todo mundo foi alinhado.”
Mais do que isso, foi feito ainda um trabalho de co-criação. Quer dizer: os direcionamentos não foram ditados top down. A empresa adotou um modelo mais democrático. “Apresentamos opções e discutimos em conjunto. O objetivo é fazer com que haja um movimento aceitação ao invés de imposição.”
Só depois de gerar desejo pela mudança, a Globo focou no treinamento dos times
Nesse ponto, a empresa adotou uma divisão onde 10% do treinamento se dava de modo formal, 20% através de coaches e treinadores internos, e 70% no dia a dia, fazendo a coisa acontecer. “Ao levar pra prática, é preciso ter constantes reforços para que os avanços não se perderem.
Se a pessoa tiver dificuldade no processo do dia a dia, sem acompanhamento ela vai voltar ao modelo antigo de atuação.” O segredo aqui, segundo Tristacci, é ter uma cultura people centric. “Isso envolve se perguntar: o que é importante para essas pessoas que as apoiam no processo de mudar? Que treinamentos ela precisa pra isso?”
Aqui, mais uma vez, o conceito de MVP pode ser útil. Define-se, então, o treinamento necessário para fazer uma iniciativa rodar. Depois partem para a aplicação. Mas um ponto de atenção! “Isso deve ser feito de forma coordenada.
Se você realizar treinamentos individuais, seu colaborador vai voltar para o time e encontrar várias barreiras. Com os colegas, com os chefes… Todos precisam estar na mesma página.” Alinhamento é palavra-chave aqui.
De acordo com Tristacci, “a cultura influencia o mindset, que influencia os hábitos, que influenciam a execução no dia a dia. Para mudar a cultura, o caminho é o inverso.
É de baixo pra cima. Nós mudamos a forma de trabalhar até que isso se torne um hábito, que muda o mindset, que por sua vez muda a cultura da empresa.” A cultura é individual. Não é da empresa por instalações.
Definir o mínimo comum, nesse sentido, dá à organização um fator de escala.
“Nós fizemos o caminho inverso. Uma empresa de mídia que decidiu que ser uma media tech é o caminho para manter a saúde da empresa.
Para isso, definimos um modelo de uma só tecnologia com quatro pilares: enterprise (soluções aplicadas dentro da empresa), soluções de mídia, operações de mídia e digital hub (soluções digitais que se conectam com onmercado).” Depois de toda a base que já abordamos aqui, os times têm liberdade para propor novos modelos de negócio.
No advertising, que atende o mercado publicitário, já aconteceu uma grande transformação. A maior receita na televisão ainda vem da publicidade, mas essa era uma oportunidade restrita às grandes firmas, com grandes budgets. “Agora existe um novo modelo de negócio que passa pelo processo de atender pequenos e médios anunciantes, os mesmos que Google e Facebook vêm capturando ao longo do tempo,” conta Tristacci.
Desde a criação do Globo Sim, esses pequenos anunciantes conseguem criar segmentações dentro da base geral da Globo. “Você consegue fazer, hoje, um anúncio na TV por R$ 30.” Para isso funcionar, foi criada uma plataforma para vender isso em escala. “Se fossem necessários vendedores, isso não seria sustentável.
Pela plataforma, o anunciante escolhe a praça, define quanto quer investir, e a plataforma tem uma estrutura de machine learning que indica o melhor formato.
O anunciante, então, pode subir o vídeo que ele quer levar ao ar.” Esse é um novo modelo de negócio criado para dar conta do cenário atual. E conforme Tristacci sinaliza, é só o começo. “Já estamos conversando sobre novas possibilidades. Se alguém está vendo um programa e quer comprar a panela que está sendo usada, vão existir formas de fazer isso de forma ainda mais natural.
A tecnologia ainda não está disponível, que é o conceito da TV 3.0., mas será. Isso possibilita ainda novos modelos de negócio.” Se adaptar às novas condições de mercado e a tecnologia, afinal, é prerrequisito para se manter relevante e crescer. Do contrário, no caso da Globo, ela se tornaria mais uma produtora de conteúdo licenciando para plataformas como a Netflix, o que lhe faria perder relevância.
Então o Transformation Experts foi criado para você. Convidamos alguns dos principais líderes em transformação digital para contar sobre seus maiores desafios e aprendizados ao longo do processo. Clique aqui para saber mais
Compartilhe:
Share on facebook Share on twitter Share on linkedin Share on whatsapp
Divida uma experiência sua. Poderá ser acrescentada no artigo, com os devidos créditos.